Testemunhos das Jornadas do FMH "Escola invertida - dos alunos aos professores"

 
Aqui ficam alguns excertos da partilha de Maria Teresa Mendes e duas crianças da Associação Florescer. Uma conversa bem viva sobre educação. Vale a pena escutar e sentir estas palavras.
 

Maria Teresa: A nossa intenção é trazer a voz das crianças para o palco.

(…) A Florescer é uma associação de educação global que foi criada há cinco anos. O foco é a área da inovação e o desenvolvimento do empreendedorismo, da capacidade empreendedora na educação numa visão holística. O que é que isto quer dizer? Na prática fomos para o terreno, tinhamos um projeto educativo de base de uma escola e não foi isso que acabou por se concretizar. Neste momento temos vários projetos, um deles é o Centro de Educação Global que é a sede da associação em Linda-a-Velha que funciona com um pequeno grupo de crianças que estão em ensino doméstico.

Desenvolvemos áreas de consultoria de formação, projetos de rede, criámos outras associações. (...)

Queremos mostrar aqui, aquilo que nos anima, que nos dá vida todos os dias e vamos partilhar esse testemunho agora. (...)

 
Testemunhos das crianças (comentários ao vídeo e entrevista): 
 

J., 12 anos: A Florescer é muito muito diferente de uma escola (…) A nossa maneira de aprender não é estar sentado numa cadeira a olhar para o quadro e o professor estar a explicar-nos coisas e ficarmos ali o dia inteiro numa cadeira (…) Aqui nós podemos mover pela sala (…) É por nós, não é um professor a ensinar-nos, somos nós que vamos aprender.

B, 11 anos: Também temos um roteiro digital no computador. (…) Nós criámos grupos de responsabilidade para não serem só as orientadoras a fazerem as coisas.

 

M.T.: O que acontece quando vocês se entreajudam? (tutorias júnior)

J. : Quando nós pedimos ajuda começamos a pensar, quando precisamos de ajuda, não é só pedir aos adultos, é pedir às crianças. Entre nós podemos trabalhar em conjunto. Não é só os adultos que sabem  tudo, nós também sabemos muitas coisas que os adultos não sabem. (risos da plateia)

 

M.T.: Na Florescer, o que acontece na rua?

J.: Na escola nós estamos numa espécie de recinto, estamos fechados lá fora, vamos ao recreio, mas mesmo assim parece que estamos numa prisão, temos grades à volta. Aqui, nós fazemos muitas saídas, vamos à rua. Vamos à Gulbenkian, vamos ao Jamor, ao Centro Comunitário, andamos a pé, nos transportes públicos! É divertido também trabalhar na rua, aprendemos coisas novas na rua, em vez de estarmos sempre fechados num sítio, assim aprendemos melhor quando vamos à rua.

 

M.T.  (a propósito da aprendizagem ao "ar livre"): Levamos a pedagogia para o contexto real e, muitas vezes, é o contexto real que nos trás o currículo que é emergente. (…) E por isso também vamos a muitos eventos e as crianças são integradas.

(tema das famílias): Também fazemos retiros com as famílias. Muita brincadeira, adultos e crianças, desenvolvimento pessoal, muito convívio (…) o trabalho com a família em primeiro lugar. 

(outros projetos associados) associação que criámos na Ericeira, a Enraizar, podem pesquisar, já temos um vídeo online, com o apoio da Câmara Municipal de Mafra. Estamos a criar uma Cooperativa de desenvolvimento local, a Vizinhar, em Oeiras.

Somos fundadoras da Rede Educação Viva, uma rede nacional que está a fazer as ligações entre vários projetos de inovação, seja em contextos de ensino doméstico, escolas privadas, escolas públicas e associações. O que promovemos, sobretudo, é unir, unir, unir para partilhar e para transformar.

 

M.T. (a propósito de uma questão de Helena Marujo na sua palestra sobre educação positiva). Em que medida é que a Florescer contribui para o vosso bem estar?

J.: Eu sinto-me mais seguro na Florescer do que na escola. Antes, quando andava na escola não sabia que existia este tipo de aprendizagem portanto não me queixava  (risos da audiência). Pensava sempre que a escola podia ser um bocadinho melhor, mas não há outra coisa! Aqui na Florescer gosto mais de estar, porque é um sítio onde nós conversamos muito, fazemos a roda da manhã, fazemos muitas coisas. Sinto-me mais confortável aqui, temos lá cadeiras que sobem e descem e rodam, que é muito mais interessante do que cadeiras onde temos que ficar sempre no mesmo sítio! Sinto que o meu bem estar é mais alto aqui na Florescer! (risos e aplausos da audiência).

 

M.T. : O que gostavas que estivesse na escola pública e privada (e que sentes na Florescer)?

B.: Gostava que nós também pudessemos ir a outros sítios na escola pública e na escola privada (…) gostava que também não houvessem grades e que não estivessemos sempre na cadeira a ouvir a professora.

 

M.T.: Mensagem a crianças e jovens:

J.: Queria mandar uma mensagem às crianças, de que vocês não podem estar sempre só a queixar da escola, têm que pensar que existem maneiras de aprender e que têm que ser mais autónomos. Podem até inventar uma maneira de aprender mais fácil, por exemplo, com jogos em casa. Temos uma dúvida de matemática, pegam num jogo ou constroem, fazem qualquer coisa para ajudar a aprender as regras. Também têm que ser elas a aprender por si próprias.

T.: É importante que tenham espaço para isso...

B.: Uma mensagem que queria dar às crianças, é que se não estivessem bem onde estavam, procuravam um sítio, falavam com os pais e mudassem para uma escola ou outro sítio onde estivessem melhor lá.

M.T.: Mas há crianças que não conseguem fazer isso, muitas vezes é dito que são mal comportadas, são muito criativas e dizem que têm doenças (…) e depois têm que tomar medicação. Há crianças que não se conseguem expressar da mesma forma. É importante conseguirmos perceber o que nos querem dizer com esse comportamento, mais do que irem à procura da causa externa. Perceber o que estão a querer dizer.

 

M.T.: Mensagens aos professores:

J.: Queria dizer aos professores que... tenho aqui uma ideia, bom, alguns professores podem não ser assim, atenção! Mas penso que normalmente os professores numa turma avançam com a matéria, não interessa se um está mais lento, se um está mais rápido, isso não interessa. Têm que dar a atenção, e ir um a um para ver se está com dificuldades, se precisa de ajuda (…) O professor podia ajudar.

M.T.: Se calhar também se podiam entreajudar e abrir as possibilidades a essa entreajuda.

 

M.T: Mensagens para as famílias:

B.: Uma mensagem que eu queria dar às famílias era para prestarem atenção à criança, para verem se está bem na escola, e se está triste ou feliz. Para prestarem mais atenção!

 

Foi um privilégio participar nas III Jornadas da Educação "Escola invertida - dos alunos aos professores". Uma excelente oportunidade para partilhar e re-conhecer projetos de educação inovadores. Um especial agradecimento a Carlos Neto, Adelino Calado e Helena Marujo pelas vossas intervenções, de grande inspiração para Portugal. 

 

 

 

Dia 22 de março de 2017:

Nas III Jornadas da Educação da Faculdade de Motricidade Humana, as crianças da Associação Florescer e Teresa Mendes vão partilhar as suas experiências no Simpósio "Aprender do avesso - aprendizagens integradas". É um privilégio estar em rede, por uma educação viva, em Portugal.